quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Realidade Virtual



"O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem."

Fernando Sabino



Na modernidade dos dias atuais as relações virtuais crescem e se multiplicam na velocidade de um “click”. Amizades, contatos de negócios, romances... Cada vez mais reais e mais freqüentes, embora ainda enfrentem algum preconceito. Muitos ainda duvidam da veracidade das relações criadas e cultivadas na rede, mas eu, particularmente acredito nelas e tenho meus motivos para isso.

Cada vez mais nos dias de hoje o tempo é um fator determinante. A maioria de nós está com todas as horas do dia preenchidas com compromissos, restando poucas horas para o lazer e o cultivo das amizades. Há também outro fator da vida moderna: a insegurança que nos rodeia e limita. Se antes ficávamos sentados em frente a nossas casas até a lua estar alta, hoje isso é quase impossível. Sair a noite é um desafio e praticamente uma aventura de onde nunca sabemos o que poderá vir. O resultado disso é que nos voltamos cada vez mais para a segurança e a agilidade do mundo virtual.

Aqueles que duvidam da força que essas relações podem ter, alegam que é muito fácil enganar, mentir e iludir no mundo virtual. Eu digo que isso é tão comum no mundo virtual quanto no mundo real. Onde quer que existam pessoas e relações entre elas haverá sempre esse tipo de acontecimento. Algumas pessoas irão mentir, enganar, fingir serem aquilo que não são, tanto na vida virtual quanto na vida real.

Mas as relações virtuais trouxeram de volta uma coisa que está a cada dia mais esquecida em nosso atribulado dia-a-dia. Na rede as relações são baseadas em conversas. Não se sustenta uma relação virtual sem muita conversa, sem troca de experiências, uma coisa que em nossa vida “real” por inúmeros motivos está a cada dia mais escassa e rara.

Até mesmo as famílias encontram dificuldades em se reunir, mesmo que seja para uma refeição. As conversas, então, quase não acontecem mais. As pessoas estão mais individualistas, não falam com estranhos na rua, sequer cumprimentam os próprios vizinhos. Um reflexo da modernidade, da insegurança, da velocidade do mundo...

Quando se trava uma relação virtual, tudo o que temos é nossa conversa, o “papo”. Estamos na segurança de nossos lares e protegidos da timidez por um teclado e um monitor, até mesmo aqueles que têm mais dificuldade em conversar encontram meios de criar laços. Quanto ao resto, se desenvolve do mesmo jeito que uma amizade “real”.

As conversas evoluem de assuntos gerais para as coisas similares que aproximam as pessoas e aos poucos passam a ser pessoais... Quando a amizade acontece começam os aconselhamentos, as trocas de segredos... Igual aos nossos pais e avós em seus quintais, com seus vizinhos.

Se antes nos reuníamos à sombra das arvores, nas praças e nas ruas, hoje é no frio mundo virtual que travamos nossas tradicionais relações de amizade, nossas conversas, desabafos e confidências. È através do toque dos dedos que estabelecemos contato com outros seres humanos como nós, que aprendemos e fortalecemos o nosso sentido de seres sociais.

Ressurgem nesse novo mundo os antigos hábitos da conversa no portão, seja para falar do tempo, seja para obter algum apoio ou conselho. E o vasto mundo se transforma em um instante em um universo de algumas polegadas, diante de nossos olhos e ao alcance das mãos.

Se de um lado o mundo moderno tem tirado tanto de nós, de outro aprendemos a tirar proveito dessa modernidade e da velocidade com que tudo se processa. As relações humanas permanecem as mesmas, baseadas nos mesmos valores de confiança, afeto e reciprocidade, a única diferença agora é que as fronteiras se alargaram imensamente.

E se é possível destacar uma grande vantagem nas relações virtuais, é sem dúvidas o fato de que no mundo virtual estamos despojados do nosso bem mais precioso, de nossa arma mais eficaz no “mundo real”. Por trás da tela do computador, não temos um rosto, nem um corpo... Não somos mais que palavras e idéias.

Se eu fosse uma idealista eu diria que as relações no mundo virtual tendem a ser mais transparentes e mais sinceras que em nosso dia a dia. Não temos nenhum motivo em especial para aceitar alguém em nosso comunicador de mensagens instantâneas ou em nossa página de relacionamento, salvo em alguns casos específicos, exceto o fato de que algo nas palavras e nas idéias daquela pessoa nos atrai.

E eu bem que gostaria que o maior interesse na aproximação das pessoas fossem realmente as idéias... Mas talvez isso seja apenas o desejo insano de uma louca sonhadora...

sábado, 7 de agosto de 2010

Quando falta alguma coisa

"O que a maioria de nós leva para o relacionamento não é a plenitude, mas a carência. A carência implica uma ausência dentro de si... A carência é uma força poderosa, capaz de criar ilusões poderosas. Ninguém pode realmente entrar dentro de você e substituir a peça que está faltando."

Deepak Chopra


Todos nós, sem exceção, temos necessidades. Coisas das quais precisamos para nos sentirmos seguros, felizes e confortáveis. O caso é que nem sempre conseguimos reunir todas essas coisas, por falta de oportunidade ou por falta de habilidade... De qualquer modo, quando nos falta alguma dessas necessidades nos tornamos carentes disso. De certa forma, todos nós sofremos de algum tipo de carência.

O problema não está em se ter ou se reconhecer essas carências. Todo o problema começa quando, instintivamente, tentamos substituir o que nos falta por outra coisa. Geralmente o que nos faz falta está fora do plano material, não é algo que podemos comprar, armazenar ou adquirir. De fato, a maior parte de nossas carências, senão todas, reside no campo dos sentimentos, fora do alcance da razão.

Por diversos motivos temos dificuldades em admitir essas faltas. Ás vezes por que simplesmente não as reconhecemos, outras vezes por que temos vergonha ou somos orgulhosos demais. De todo modo, o que fazemos é ignorar a ausência real e nos apoiarmos em outra coisa. Algo que possamos adquirir, que possamos ter quando sentirmos vontade.

Algumas pessoas preenchem o vazio de suas carências com coisas materiais. Tornam-se compradores compulsivos, gastando, muitas vezes, além do que poderiam; transformam-se em glutões, comendo além da necessidade natural, sem muitas vezes compreender de onde vem tanta “fome”. Outras vezes procuram substituição em outras esferas e aí encontraremos pessoas viciadas em sexo, ou aquelas que vivem relações de excessivo apego que geralmente se tornam repetitivas e algumas vezes destrutivas.

O que acaba ocorrendo em todos os casos é que a carência real nunca é preenchida e a necessidade criada para substituí-la nunca é plenamente satisfatória, além de criar outros problemas.

Não importa o quanto compremos roupas novas e o quanto nosso armário esteja cheio, aquela estranha sensação de vazio ainda vai estar lá no final do dia, sempre que virmos as roupas ainda com as etiquetas; durante todo o passeio pelas lojas. Nunca será o suficiente! Por que o que nos falta de verdade não são roupas melhores ou mais bonitas e sim alguma outra coisa. Estaremos provavelmente endividados, com muito mais roupas do que precisaríamos e ainda sentiremos que algo está faltando.

Podemos comer quanto formos capazes, devorar uma sem conta de sanduíches de fast food, tortas e doces. Tudo o que ganharemos com isso serão alguns quilos a mais, talvez o aumento das taxas de açúcar e gordura no sangue, a sensação de culpa comum por termos ultrapassado os limites. Enfrentaremos um novo problema: a estética. E ainda assim, o vazio interno, a “fome” interminável não irá embora.

Quando colecionamos amantes, podemos até termos alguma fama em nosso círculo de amigos, podemos nos vangloriar do nosso poder de sedução e da quantidade de parceiros que tivemos, arriscando muitas vezes a saúde e, em alguns casos, a tranqüilidade. Mas ainda que tenhamos sempre companhia em nossas camas perceberemos, quando estivermos sozinhos, que o vazio que nos consome permanece dentro de nós e parece ficar cada vez maior.

Colecionadores, viciados, pessoas que amam demais, viciados em trabalho, desafiadores da morte... Todos que se dedicam excessivamente a uma única atividade, na maioria das vezes estão tentando preencher uma lacuna deixava há muito tempo.

Reconhecer o que realmente nos faz falta é o primeiro passo e o mais complicado. São poucos os que conseguem esse reconhecimento sozinhos. Mas podemos identificar com alguma facilidade que repetimos o mesmo comportamento, sem pausa, sem no entanto nos sentirmos satisfeitos, mesmo quando percebemos que estamos nos excedendo naquilo que fazemos.

O mundo moderno está edificado sobre nossas carências. As campanhas publicitárias são construídas para oferecer substitutos artificiais para o que nos faz falta desde a infância. Para pouco tempo com os pais, um super vídeo-game! Se o problema forem pais separados, a última geração em brinquedos. Para crianças com poucos amigos, tudo o que quiserem comer... Desde muito jovens somos direcionados para essa substituição parca e insatisfatória. Depois de adultos repetimos o padrão e repassamos aos nossos filhos. Um círculo vicioso de carência e infelicidade.

O que temos que ter em mente é que é impossível substituir certas coisas. Se perdemos alguém que amamos, não iremos recuperar o que tínhamos com essa pessoa numa nova relação, nem iremos preencher o espaço deixado por ela com compras ou alimentos. Nada pode preencher o vazio deixado pelas horas em que não estivemos com nossos pais, as reuniões familiares perdidas, os amigos que se foram... Não podemos preencher nossa solidão com sacolas e pratos cheios ou grandes faturas de cartão de crédito.

Quando alguma coisa faz falta precisamos um tanto de coragem para reconhecermos nossa carência e outro tanto mais para buscarmos preencher esse espaço com o que realmente necessitamos. Talvez seja um abraço ou um pedido de desculpas, talvez seja um pouco mais de tempo para estar com a família, talvez precisemos dar um pouco de nós para recuperar aquilo que em outro tempo não tivemos... Seja como for, olhar para dentro e prestar um pouco de atenção muitas vezes resulta em muito mais lucros do que podemos imaginar.

Mas é claro que sempre estaremos em busca de algo que nos complete, só falta-nos descobrir o que...

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Quando o inevitável acontece


"A dor é inevitável. O sofrimento é opcional."
Carlos Drummond de Andrade


Costumamos considerar palavras como sempre e nunca apenas como palavras. Sabemos desde cedo que, como se diz, para sempre é tempo demais, impossível de ser medido ou vivido. Nunca mais é igualmente impossível de conceber, inadmissível, incalculável.
Talvez esse seja um dos motivos que torna a morte tão inconcebível. O motivo mais humano, mais comum a todos é simplesmente esse: o fato de ser impossível de aceitar e entender que nunca mais veremos aquela pessoa, nunca mais iremos conversar com ela, nunca mais poderemos tocá-la ou olhar em seus olhos.
Não importa a crença ou a definição de damos para a morte, sua chegada é sempre indesejada e inesperada. Nunca conseguimos lidar bem com o sentimento de perda, com a sensação de que pela primeira vez a expressão “nunca mais” é concreta e real.
Quando perdemos alguém que amamos, esquecemos momentaneamente tudo o que aprendemos ou estivemos cultivando. Qualquer preparação ou conscientização que tenhamos construído ao longo da vida se desfaz diante da presença do inevitável.
O incomum em tudo isso é que desde o dia em que nascemos a única certeza que temos, a única coisa infalível e real é que todos nós, independente de qualquer coisa, irá morrer. E por que então é justamente esse o único evento com o qual não sabemos lidar?
Os motivos são os mais variados, desde a nossa incompreensão com o que não podemos mudar até o nosso egoísmo humano. Sim! Somos todos muito egoístas, por melhores que sejamos como pessoas, por melhores que sejam nossas intenções e sentimentos estamos sempre impregnados desse egoísmo típico da nossa raça humana. A abnegação, o abri mão de nós pelo outro, não é natural do ser humano.
Quando sofremos pela perda de alguém, por mais que queiramos justificar esse sofrimento com motivos aceitáveis como a saudade e o amor, na verdade estamos sofrendo por nós mesmos. Sofremos pela nossa impotência em impedir a separação, pela inegável verdade de que, diferente do que pensamos, não temos poder algum sobre o tempo e sobre as ações do universo.
A morte, para muitos de nós, é o nosso primeiro enfrentamento com uma força desconhecida a qual não dominamos, que não podemos manipular nem modificar. É o nosso primeiro fracasso irreversível. Percebemos aí que somos frágeis e que, como tudo na natureza, obedecemos, mesmo que a contragosto, o ciclo natural da vida: nascer, crescer, reproduzir-se e morrer.
E embora seja tão natural, tão óbvio e tão compreensível, simplesmente não conseguimos aceitar o andamento do universo.
O egoísmo reside no mesmo ponto do nosso amor. Quando amamos alguém, ou mesmo alguma coisa, queremos que nos pertença, que esteja conosco sempre, nunca longe, nunca além do alcance dos olhos ou das mãos. É difícil para nós aceitarmos que o ser amado não esteja conosco, pois não entendemos o amor sem a aproximação, sem a presença física. Outra vez, sofremos com a morte por nós mesmo, por nossa incapacidade em compreender que embora o ser que amamos não esteja mais presente, o amor permanece em nós.
Outra fonte da nossa incompreensão e do nosso sofrimento com a morte é o desconhecido. Custa-nos aceitar aquilo que não entendemos. Assim é com nossos medos e preconceitos e não é diferente com a morte. Por mais que nossas crenças nos forneçam explicações e uma série de motivos para que estejamos confortáveis com esse acontecimento, não são coisas que nossa razão aceite facilmente.
É difícil para o entendimento humano compreender o que ele nunca viu ou viveu. É a mesma irracionalidade que explica certos medos que muitas vezes nos acompanham pela vida inteira, como o medo do escuro. Não é de fato a escuridão que assusta e sim aquilo que não podemos ver nela! Assim como não é da morte que temos medo e sim daquilo que não sabemos sobre ela, sobre o que virá depois dela: o desconhecido.
Não podemos negociar com a morte. É impossível barganhar com ela... Ainda lutamos para distorcer o tempo com fórmulas miraculosas para combater o envelhecimento, cirurgias e outras tantas técnicas; temos a ilusão de dominarmos as doenças criando drogas poderosas que as aplaquem e curem; reunimos tantas posses quanto possível para lançar raízes nesta vida como se ela de fato nos pertencesse e como se pudéssemos dispor dela como bem entendêssemos. Mas sabemos que nada disso nos torna superiores às forças do universo.
Ainda que consigamos dobrar a natureza aos nossos desejos, é ela quem dita o nosso comportamento, é ela quem nos conduz e que, de fato, nos domina. Quando ignoramos isso vivemos desastres grandiosos ao qual, incapazes de admitirmos nossa insignificância diante do universo, chamamos de tragédias.
Somos capazes de compreender isso? Que não somos nada senão mais uma espécie a ocupar o planeta? Que assim como os animais e as plantas estamos sujeitos a ordem natural das coisas? Que não possuímos nenhum privilégio ou poder que nos permita ir além que qualquer outro ser vivo?
Se qualquer um de nós morresse hoje, agora, o universo continuará seu curso, sem mover-se um único milímetro de sua trajetória. O sol irá nascer e se porá normalmente, como todos os dias. As pessoas ainda irão acordar pela manhã, irão se alimentar, trabalhar, amar e brigar. Nada de fato será diferente. E quantos de nós morrem todos os dias? Basta abrir um jornal ou assistir as noticias... E o que nos faz diferentes deles?
A única diferença, a única que percebemos é quando somos nós ou alguém que é nosso, embora esse conceito de posse não tenha nenhum valor para o universo. Aceitamos e entendemos a morte, o ciclo natural da vida, desde que ele não entre dentro do espaço que delimitamos como nosso.
Mas somos apenas parte do todo. E como tudo o que está vivo estamos destinados a ser parte do ciclo de renovação da vida, onde todas as coisas precisam morrer para dar lugar a nova vida, para dar continuidade ao universo. Tão natural quanto a muda das folhas de uma árvore e a morte dos frutos que lança novas sementes ao solo...
Mas é claro que somos apenas humanos e por mais que saibamos de tudo isso, esse entendimento simplesmente não nos alcança...

sábado, 31 de julho de 2010

Algumas palavras sobre o amor


"O mal nunca está no amor."
André Gide


Estive pensando a respeito do amor, e, por favor, não estou falando aqui dessa coisa idealizada, empacotada e comercializada que conhecemos por amor romântico. Fomos tão inundados por essas idéias de romance e encantamento que acabamos por esquecer o verdadeiro significado dessa palavra. Para mim, particularmente, o amor vai muito além dessa baboseira de romance.
Outro dia escrevi uma frase em meu Orkut e vi brotarem comentários perguntando se eu estava apaixonada ou quem era “ele”. Bom, ele era uma menina... A frase se referia a uma de minhas amigas. Se falava de amor? É claro! E acaso a amizade não é um dos tipos mais complexos de amor que existe?
Queria saber quem foi que ditou as regras... Quem foi que disse que só se pode falar de amor quando esse está ligado diretamente ao romance ou ao sexo? E mais: o que tem haver amor com sexo?
Amizade é amor. Não tenho dúvidas sobre isso.
Desde sempre entendi que amor era o principio, o meio e o fim de tudo. É pelo amor que viemos a este mundo; pelo amor atravessamos a vida e é só o amor que resta no final. Nenhuma de nossas conquistas materiais, físicas e temporárias vai permanecer quando morrermos, exceto o amor, aquele que distribuímos e o que recebemos. Mas estamos tão desacostumados a pensar sobre isso dessa maneira...
Sempre acreditei que amor é sinônimo de cuidado, preocupação, dedicação, entrega, respeito e outras tantas coisinhas que se somam. Nunca vi o amor como domínio exclusivo de um casal (homem x mulher), restrito a namoro, casamento e sexo. Sempre encarei este sentimento como a fonte de toda a vida, a razão que motiva tudo no universo.
Enquanto eu crescia, descobri que o amor que nos ensinavam era só um sentimento egoísta que muito mais tinha de orgulho e auto-proteção do que de verdadeiro amor. Homens procuram por mulheres que possam fazer com que se sintam mais “machos”, que possam exibir aos amigos como troféus de caça e, em alguns casos, procuram por uma substituta de mãe. Mulheres procuram por homens que a façam sentirem-se mais “fêmeas”, que satisfaçam sua necessidade de aprovação, que atendam sua vaidade e, do mesmo modo que os parceiros procuram alguém que preencha o papel de pai. Ah! Mas eu incorri no mesmo erro que tanto critico, detive-me ao amor romântico.
E não são os mesmo motivos que nos aproximam de todas as pessoas? Escolhemos amigos pelo status que podem nos dar, pelas vantagens que possamos extrair dessa associação, pelo quanto eles nos tratem bem, pelo quanto são inferiores a nós (acreditem! A quem se julgue superior e crie uma rede de amizades de pessoas supostamente inferiores apenas para que continue a garantir seu lugar no topo!). Mulheres se sentem ameaçadas por amigas mais bonitas, solteiras, mais livres, mais ousadas... Homens se sentem ameaçados por amigos mais bem sucedidos, mais ricos, solteiros... E eu me pergunto onde é que está o amor em tudo isso?
Já ouvi boas pessoas, dizerem que não poderiam ser amigos dessa ou daquela pessoa por que se comportavam de determinada maneira. Já ouvi perfis bem traçados do que amigos poderiam ou não fazer. Já ouvi tantas coisas que nem sei como descrever... Mas sempre ouvi muito pouco sobre o amor.
Eu tenho minha cota de amigos. E costumo brincar dizendo que não tenho talento para atrair pessoas normais. E é verdade! Tenho uma tendência engraçada a me aproximar de pessoas com problemas dos mais diversos, antes mesmo que imaginar que elas possuam tais dificuldades. E estou falando desde pessoas com problemas familiares até depressivos como eu. Meus amigos não são perfeitos, bem como eu mesma não sou. Muitos deles, senão todos são muito melhores que eu em tantos aspectos que chego a me envergonhar. E eu os amo profundamente.
Amo-os ainda mais quando brigamos. Sempre elogiei a sinceridade e a franqueza nas pessoas, pois são de fato características que admiro e que procuro cultivar em mim mesma. Quando um amigo se atreve a me criticar, muitas vezes de forma dura, minha estima por ele cresce. Há um pouco de egoísmo nisso, é claro. De todo modo eu estou usando meus amigos para meu próprio crescimento pessoal. Mas há nisso um tanto mais de amor que supera qualquer outra coisa.
Já fui questionada por causa de minhas amizades dúzias de vezes. Por que eu sustento essa ou aquela amizade quando aparentemente não recebo nada dela? Eu nunca tive uma resposta para isso. Por amor é tudo o que eu posso dizer. Amor não se escolhe, ele simplesmente acontece. Se eu escolhesse amar apenas as melhores pessoas, com as melhores características, isso não seria mais amor e sim puro interesse. Eu apenas deixo o amor fazer as escolhas...
Ao longo da minha vida, aprendi que o amor nos ensina a compreender que a razão é uma coisa muito relativa e geralmente mesquinha. Ter ou não razão não importa nada quando o que está em jogo é algo superior. Aprendi que o amor nos ensina a respeitar; que diferenças não são motivos para declarações de guerra. Aprendi o significado de coisas como incondicional e desinteresse. Entendi que o que me move a fazer qualquer coisa pelo outro é o amor que sinto e não o que o outro sente por mim ou o que eu posso lucrar com isso.
O amor, como um jogo de interesses, é bem mais agradável, é verdade. Afinal está baseado numa troca infinita. O amor em si é um “dar e receber”, de fato. O problema é que cismamos na certeza de que esse “receber de volta” tem necessariamente que vir do outro, diretamente, na forma de alguma coisa feita ou dita. Mas não é assim.
O “dar e receber” do amor é bem mais sutil que isso. Esse retorno, que muitos de nós não vemos chegar das mãos do outro, está, na maior parte das vezes, encerrado no próprio ato de dar. Muitas vezes só entendemos o quanto alguém nos deu em troca quando essa pessoa já não está conosco e depois que o acusamos infinitas vezes de ingratidão. Bom, como muitas coisas nesse universo, nem sempre recebemos aquilo que esperamos ou que achamos que devemos receber, mas sempre recebemos o que merecemos e o que precisamos... Toda vez.
Eu poderia escrever sobre isso por horas, sobre todos os tipos de amor que conheço e aqueles que ainda não conheci, mas sou capaz de reconhecer quando vejo... Sobre os sinônimos que se foram criando ao longo do tempo e que perderam sua relação original com o sentimento que lhes deu origem (como a caridade, por exemplo). Sobre a gama infinita de sentimentos que está encerrada no sentido amplo do amor e sobre as tantas recompensas que existem nele.
No fim ainda penso que o mais importante seja esse sentido de que o amor é tudo o que há. Pelo que vale viver e pelo que vale morrer. Que o amor, por si só já nos dita suficientes regras morais e comportamentais que poderiam dispensar tantas outras que trazemos penduradas em nós...
Mas é claro que isso são apenas conjecturas e reflexões...